A união entre arte e terapia para chegar a um estado de presença e cura


Como podemos utilizar a arte e a terapia como mecanismos para atingirmos um estado de maior prazer? Samantha, atriz e psicóloga, reuniu um grupo de pessoas para descobrir como esses universos podem se juntar em um trabalho de cura. Para saber mais, ouça o Episódio 03 do nosso podcast.

Ao longo de seus 28 anos, Samantha Pires sempre transitou entre os mundos da terapia, onde se formou psicóloga, e da arte, como admiradora e praticante. Esses dois ambientes, de alguma maneira, a levavam a um estado de observação e abertura para a comunicação.

Enquanto a psicologia apareceu como o caminho profissional, a arte era o lugar onde Samantha derrubava as suas barreiras pessoais para descobrir uma expressão mais espontânea e livre, além de ficar mais junta das pessoas.

"A experiência da arte, como atriz e também como consumidora de arte, é parte do meu dia a dia, e é um lugar de estar em relação com as pessoas. Mesmo ouvindo uma música sozinha em um ambiente, eu não me sinto sozinha. Eu estou em contato com alguém, com quem compôs aquela obra", resume.

A conexão entre terapia e arte, no entanto, não era evidente para ela – na verdade, eles pareciam ser dois caminhos diferentes, e até irreconciliáveis. Mas ao perceber o potencial terapêutico que a arte tinha em sua própria vida, ela começou a pensar em como poderia aproximar as duas áreas.

Os métodos tradicionais de união entre arte e terapia que Samantha conhecia não eram exatamente o que ela estava procurando, apesar de ela reconhecê-los como importantes em seus contextos. Ela cita, por exemplo, o uso de musicoterapia em pacientes com problemas de saúde mental. "É um trabalho de aliviar momentaneamente as angústias de um paciente, que é válido. Mas eu queria levar isso para um lugar mais sério e mais profundo, e não sabia como fazer."

Ela tinha muitos esboços de projeto na cabeça, mas nada muito concreto. "Eu achei que demoraria uns 20 anos para implantar esse trabalho", diz.

Um grupo se forma

Enquanto se questionava sobre qual projeto poderia sair dessa ideia inicial, Samantha descobriu o Clear Purpose Framework, com a proposta de clarear as ideias que estavam na sua mente, e decidiu passar pelo processo completo. "Foi perfeito, porque o framework te ajuda a reorganizar os recursos, potenciais, ideias e projetos que já estão na sua mente para, aí sim, começar a colocar em prática."

A primeira pergunta do framework não envolveu exatamente arte ou terapia, e sim o conceito de presença. "Essa é uma palavra que está na moda, mas não me parece que as pessoas sabem exatamente o que é estar presente, ou como esse estado acontece. Fica num lugar distante, meio místico. Nossa ideia era explorar como os seres humanos, enquanto cultura, entendem e exercitam a presença, e o que a arte e a terapia têm a ver com isso", conta.  

Essa conexão entre arte, terapia e presença se tornou o fio condutor do processo no framework e também do seu projeto prático, que começou a ganhar forma. No contexto de distanciamento social por causa da pandemia do coronavírus, as possibilidades se tornaram mais limitadas, e uma ideia específica ganhou força: um grupo online formado por artistas e terapeutas para discutir esse assunto com mais profundidade.

"Foi uma ideia que partiu da certeza de que eu não sou a única pessoa pensando em construir uma ponte entre arte e terapia. Quem tivesse esse mesmo interesse em fazer uma pesquisa prática e teórica sobre esse tema teria um meio para isso."

Samantha começou a convidar os amigos que poderiam se interessar em entrar nesse debate, e esses amigos também convidaram conhecidos. O grupo reuniu cerca de 25 pessoas, que se encontram a cada 15 dias – o número de presentes nas reuniões varia. "E o mais legal é que, como o encontro é online, temos pessoas de todos os lugares - brasileiros de vários estados diferentes ou que estão em países diferentes", diz.

A cura está na presença

O primeiro encontro começou com a pergunta sobre o que é presença, e como a arte e a terapia se conectam a ela. No fim, eles terminaram com muitas questões, que se tornaram a pauta do segundo encontro, e a dinâmica se repetiu nas semanas seguintes.

Além dos insights sobre esse debate, os participantes perceberam a conexão que sentiam entre si – e a terapia já começava ali mesmo. "É uma forma de trocar experiências, criar uma conexão e perceber que não estamos sozinhos – mesmo nessa hora em que, fisicamente, estamos mais sozinhos. Tem sido incrível. As pessoas estão felizes por esse tempo juntos, se olhando, se curtindo."

Mas além da experiência sobre estado de presença que os artistas-terapeutas têm vivenciado nos encontros, já há um aprendizado prático sendo levado para o mundo, com os participantes relatando que esse trabalho já tem reverberado em suas rotinas, tanto na produção artística quanto no relacionamento com as pessoas e pacientes.

Quando Samantha é questionada sobre para onde esse projeto caminhará, ela pensa um pouco antes de responder. "Pode ser que surja um grupo de teatro, ou que os psicólogos desenvolvam técnicas e experiências utilizando a arte como instrumento. Pode ser que a gente produza algo juntos."

"Mas, independentemente do formato, o que eu espero é que a gente contribua para um mundo em que a arte esteja sendo usada conscientemente como um instrumento de cura, de libertação, de terapia. É só isso que eu quero do grupo."

Na visão de Samantha, esse mundo que entende a arte como instrumento de cura também será um mundo onde as pessoas conhecerão um verdadeiro estado de presença. "Que as pessoas saibam o quanto é natural, desejável, prazeroso e espontâneo estar ali, vivo, todo o tempo, e não apenas em instantes específicos. Esse para mim é um mundo feliz."

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